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terça-feira, 29 de maio de 2012

A Marcha da Maconha em Blumenau



Aconteceu no ultimo domingo (27/05) a polêmica Marcha da Maconha em Blumenau.

Antes de iniciar qualquer texto, é imprescindível esclarecer a todos os leitores que a marcha em si é um direito civil garantido por uma decisão do Supremo Tribunal Federal na Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 187 e pela Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4.274 nos quais ficou decidido por unanimidade que a Marcha da Maconha é um direito do cidadão, amparado pelo Inciso XVI do Artigo 5º da Constituição Federal, desde que não envolva menores de idade e tampouco se faça a utilização da droga em locais públicos durante o evento.

Desde a Antiguidade a maconha – ou Cannabis sativa – é amplamente usada no Oriente como remédio e em rituais religiosos, fazendo até parte de algumas mitologias. Gregos e romanos a usavam na confecção de tecidos, cordas e velas.

Ironicamente, a primeira Bíblia tipografada – de Johannes Gutenberg, na Renascença – foi impressa em papel de cânhamo, uma substância presente abundantemente no caule da maconha.

As primeiras menções históricas da utilização da droga propriamente dita no Brasil remetem à época colonial, quando escravos traziam ‘cigarrilhas’ escondidas e usavam em rituais de Candomblé e para fins meramente relaxantes.

O Brasil chegou até mesmo a ter uma Real Feitoria de Linho-Cânhamo (maconha), em 1783.

Até o final do século XIX a planta era legalizada, mas vista com preconceito pela realeza luso-brasileira por representar os escravos e os costumes africanos.

Em 1830 um ofício da Câmara Municipal do Rio de Janeiro (capital do país, naquela época) proibiu o uso da maconha, mas só veio a ganhar maior força de opressão no começo do século XX, quando os cigarros da planta começaram a se popularizar vertiginosamente.

Na década de 20 uma pesquisa pouco confiável alegava que a cannabis matava mais do que o ópio e isso bastou para que ela fosse inclusa na lista de drogas mais nocivas do mundo.

Com o passar dos anos muitas pesquisas tem sido feitas e a droga foi liberada em muitos países, mas muito ainda se discute a respeito. Alguns especialistas afirmam que ela destrói irreversivelmente os neurônios afetando a inteligência dos usuários, enquanto outros afirmam que seu uso incentiva a criação de ligações nas sinapses aumentando a inteligência de quem a consome. 

O que se pode afirmar seguramente hoje é que ela possui propriedades relaxantes indubitáveis e que não é possível se ter uma overdose a utilizando.

Países como Argentina, Bélgica, Índia, Paquistão, Peru e Uruguai a legalizaram. Austrália, República Tcheca (onde nem a prostituição infantil é crime), Macedônia, Canadá, Equador, México, Chile, Finlândia, Holanda, Colômbia, Alemanha e Portugal a descriminalizaram.

A diferença entre legalizar e descriminalizar é que quando se legaliza é permitida a comercialização em todo tipo de estabelecimentos (como o álcool, o cigarro e a aspirina), ao passo que descriminando apenas deixa de ser um delito a utilização da substância.

Remédios como o Sativex, do laboratório Novartis, são feitos à base de cannabis. Assim como muitos anestésicos são feitos de cocaína, antitussinógicos de heroína e psicotrópicos de metanfetaminas. Por isso muitos que defendem o uso de qualquer tipo de droga costumam usar a comparação com remédios farmacológicos, que também são drogas.

Contudo, os remédios são usados sob prescrição médica, caso contrário podem matar.

Outra afirmação recorrente sobre a maconha no Brasil tem a ver com o tráfico. “Se eu plantar em casa, não preciso comprar de ninguém e assim o tráfico acaba”, simplificou um manifestante. Contudo a maconha não é a única droga e se for tão fundamental assim para o tráfico, esses criminosos – uma vez que perderem seus clientes – passarão a cometer outros crimes, como sequestros. Criminosos profissionais não vão deixar o submundo só porque perderam uma clientela.

Contudo, sabemos que muitas das coisas que hoje todos fazem e usam – como as camisetas de algodão ou as lâmpadas de xenônio – já foram proibidas e criminalizadas no passado.

Basta lembrar-se da Lei Seca que ocorreu nos Estados Unidos entre 1920 e 1933. Ela não desincentivou o uso do álcool... ao invés disso, ela serviu para que a Máfia ganhasse uma força que por muitas décadas não teve par naquele país.

A indústria tabagista é hoje, provavelmente, a maior assassina do planeta. Por ano, 200 mil pessoas morrem devido a utilização do cigarro só no Brasil. Esses pequenos bastões de câncer possuem mais de 80 substâncias altamente tóxicas em sua composição e só não são proibidos porque sua indústria bilionária tem o segundo maior lobby do mundo (o primeiro é da indústria farmacêutica, que brinca com a saúde das pessoas só para ganhar dinheiro).

Entretanto, há mais do que a saúde em questão: há educação.

Existem leis que proíbem fumantes de poluírem os pulmões das pessoas a sua volta com seu vício em diversos lugares, mas isso nem sempre é obedecido. O mesmo ocorreria com a maconha?

Sim, a manifestação foi um belo exemplo de militância dado por centenas de jovens blumenauenses nesse domingo que apenas queriam fazer valer seus direitos e colocar em pauta a discussão entre liberdade individual e moral coletiva. E isso por si já é válido.

No entanto, apesar dos esforços e da dedicação dos organizadores para que a Lei fosse cumprida durante a marcha, havia diversos menores de idade e algumas pessoas fumando abertamente seus ‘baseados’ enquanto caminhavam pela XV de Novembro. Infelizmente a falta de bom senso de poucos, às vezes põe a perder a legítima luta de muitos. Talvez seja esse o aspecto mais periclitante.

Outro ponto a ser citado eram os momentos nos quais alguém tomava a voz, falava e fazia com que os manifestantes repetissem o que foi dito, algo que desvirtuou um pouco a ideia de liberdade individual.

E o momento em que todos começaram a saltar cantando ‘pula quem não é careta’ soou provocativo. Não é de bom gosto uma brincadeira que soe como desafio quando todos sabem que muitos jovens se viciam em drogas (de qualquer tipo) justamente por serem desafiados. E o termo ‘careta’, aliás, é uma palavra extremamente obsoleta que podia até ser moda nos anos 70, mas não mais em 2012.

Em contrapartida, muitas pessoas que estavam na rua e presenciaram a manifestação demonstraram indignação, alegando que existem causas mais importantes pelas quais lutar.

Esse é um pensamento ruim.

Nenhuma causa é maior ou menor que outra. Esses jovens lutam para que seu hábito seja descriminalizado. Outros lutam para que políticos corruptos paguem por seus crimes. Muitas pessoas dedicam suas vidas a ajudar crianças abandonadas, enquanto outras se entregam com devoção a garantir os Direitos dos animais. Nenhuma dessas lutas é boba, desimportante ou pequena. Não há parâmetros de comparação. Se cada um lutar pelo que acreditar, a sociedade se tornará, muito possivelmente, um lugar bem melhor para se viver.

E aos que ainda têm esperanças que a presidenta Dilma Rousseff tome posição em relação à legalização (ou ao menos descriminalização) da maconha, fica a má notícia: ela não teve dignidade sequer para vetar o novo Código Florestal, não parece que terá peito para encarar uma discussão dessas.

Eu não bebo, não fumo e tampouco uso qualquer tipo de substância ilícita, não me posiciono nem a favor e nem contra a maconha: me posiciono em prol da discussão civilizada que leve a uma atitude coerente que seja boa a todos, mas sem grandes lobbies envolvidos. Quer legalizar a maconha? Legalize. Quer proibir porque ‘faz mal’? Então que também sejam proibidos os cigarros e remédios como o Roacutan, que deliberadamente matam centenas de pessoas diariamente no mundo inteiro.

No entanto, fica a questão: uma pessoa não é livre para decidir se quer se arriscar, se viciar ou até morrer? Se a resposta for não, então a Liberdade é uma mentira tão mal contada quanto a Democracia.













































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